O desdém e a calma dos mártires,
A mãe de outrora, condenada como bruxa, queimada com madeira
seca, sob o olhar dos filhos,
O escravo perseguido pelos cães que tomba durante a corrida, se
apoia na sebe, ofegante, coberto de suor,
A dor aguda e súbita que o aguilhoa nas pernas e no pescoço, o
criminoso chumbo grosso e as balas,
Tudo isto eu sou ou sinto.
Sou o escravo perseguido, recuo com o ataque dos cães,
Inferno e desespero invadem-me, os atiradores disparam sem parar
sobre mim,
Agarro-me à vedação da sebe, o meu sangue escorre lento, diluído
com a lama da minha pele,
Tombo em cima das ervas e das pedras,
Os cavaleiros esporeiam os cavalos relutantes, aproximam-se,
Gritam-me injúrias às minhas orelhas estonteadas e espancam-me
violentamente com o cabo dos chicotes.
As agonias são uma das minhas mudanças de vestuário,
Não pergunto ao ferido como se sente, eu próprio me transformo
no ferido,
As minhas feridas ficam lívidas no meu corpo enquanto me apoio
numa bengala e observo.
...
WALT WHITMAN , Folhas de Erva