- Dois poemas (incríveis, fabulosos) que o Jornal de Letras divulga na edição actual:
de Arménio Vieira, cabo-verdiano e recente Prémio Camões
NUNCA DOBRES A ESPINHA
Há nojentos gestos actos
Há palavras que eu detesto
Rezar Gemer Flectir
ou então abrir a boca
(como um tanso, feito merda):
«Ora sim, meu senhor»
Ora bolas é que é!
Ora bolas! Ora chiça! Ora poça!
Isso tudo mais o punho
bem na cara do safado
Cinco dedos cerradíssimos:
«Ora toma, seu sacana»
e de José Mário Silva, do seu recente livro LUZ INDECISA
Os corpos encostados à parede
talvez recordem paisagens brancas,
um inverno ucraniano com árvores
perdidas na neve.
Que outros olhos
viram estes olhos?
Eu passo por eles,
eles não me vêem. Partilham a garrafa
de vinho, um pente. E a montra do café,
apagada e triste, serve-lhes de espelho.