"A Amália é ao mesmo tempo coração e é cabeça, porque é muito inteligente mas há muito sentimento, quer dizer, aquilo é verdade, não há nada postiço. Daí que haja muito poucas meias tintas, as canções da Amália são quase todas muito tristes ou muito alegres, o registo intermédio é uma coisa muito difícil para ela. Não lhe sai. Da mesma maneira que há cabeça e coração, também há palavra e música.
Uma das coisas pelas quais ela nos faz falta hoje em dia é para percebermos nessa inteligência toda qual é a componente intuitiva e a componente consciente... Ela sempre fez o que quis. O Coração independente é tudo menos uma figura, ela de facto era uma interprete que tinha de se sentir bem naquilo que cantava. Onde está entrega-se por completo; diverte-se ou sofre. Uma das Amália não é mais Amália que a outra Amália. A riqueza da personagem também assenta muito nessa contradição. Depois imagine o que é uma pessoa com esta cabeça, com este mundo, com estas coisas todas e ainda por cima com aquela voz. Que dizer...assim não vale..."
David Ferreira (filho do David Mourão-Ferreira)
em depoimento oral ao Jornal de Letras.