25 de Maio de 2010

Ninguém daria um centavo pelos teus pensamentos…Mas já valeram bastante dinheiro.

…o que se ganha é a felicidade da vista e do coração.

É um jogo como qualquer outro…Mas dava ao jogador a vantagem de se poder movimentar enquanto jogava…

…caminhando com longas passadas de cegonha…e com qualquer coisa do voo das galinholas.

Agora querem saber…e estão plenamente certos que já não posso fazer amor.

…não gosto nada de contas excessivas no carniceiro…mas ordens são ordens…Os erros é que não são bons companheiros de sono…metem-se na cama e ficam lá connosco.

Retrato – disse ele à rapariga e ao retrato, e à rapariga outra vez: mas não havia rapariga e o retrato era o que era…Amo-te muito, retrato. Mas não te zangues comigo. Amo-te porque és muito belo. Mas ainda amo mais a rapariga, um milhão de vezes mais, ouviste?

 

(Ah. Mas a rapariga do retrato disse ao

rapaz que olhava o retrato da rapariga

que a rapariga do retrato não era o retrato

da rapariga e que o rapaz apenas podia olhar

e expirar a palavra gostar)

publicado por carlos lopes às 19:55

19 de Maio de 2010

Exame da oral de português no final do primeiro ciclo dos liceus, antes do 25 de Abril:

 

"Havia um júri de três professores, eu sentado numa carteira em frente, como num julgamento em tribunal, atrás de mim uma sala quase vazia, com a minha mãe ao fundo, a assistir, entre entusiasmada e nervosa, e, de repente, eu: «Gosto de ler, sim, sotôra. Adorei o último livro que li. Era do Jorge Amado e chamava-se Capitães da Areia».

A senhora começou a ficar muito branca, os seus pares de júri entreolharam-se, fez-se um silêncio pesado na sala, eu não percebia porquê, o livro era mesmo muito bom, tinha vontade de lhe falar do Pedro Bala, do seu amor por Dora, das prostitutas que o janota do Gato namoriscava, mas talvez fosse melhor não.

A professora recompôs-se. Inclinou-se ligeiramente para a frente e disse-me baixinho: «Muito bem, vamos lá dividir as orações deste texto…»

À noite, o meu pai, orgulhoso de mim, explicou-me que o livro tinha venda proibida em Portugal."

 

Vítor Serpa, Jornal de Letras

publicado por carlos lopes às 09:33

14 de Maio de 2010

“…No pátio quadriculado chovia, o céu quadriculado parecia o esgar de um robô ou de um deus feito à nossa semelhança, na relva do parque as oblíquas gotas de chuva deslizavam para baixo, mas teria significado o mesmo se deslizassem para  acima, depois as oblíquas (gotas) transformavam-se em circulares (gotas) que eram engolidas pela terra que sustentava a relva, a relva e a terra pareciam falar, não, falar não, discutir, e as suas palavras ininteligíveis eram como teias de aranha cristalizada ou brevíssimos vómitos cristalizados, um rugido que mal se ouvia, como se Norton em vez de chá naquela tarde tivesse bebido uma infusão de cacto peiote.”

 

Roberto Bolaño

 

(cacto peiote: Peiote é um pequeno cacto mexicano produtor de mescalina)

publicado por carlos lopes às 11:33

11 de Maio de 2010

Preciso de ti. Não me olhes assim. Bem sei que te digo isso sempre e que preciso de ti já há alguns anos, embora ainda hoje não te entenda bem e me veja sempre enamorado de ti. Preciso dizer-te, no entanto e mais uma vez, que já te ouvia a reverberar, sob a forma de uns estranhos ruídos, quando estava ainda dentro da barriga de onde saí. Preciso dizer-te que, miúdo, eu te percebia nas bocas a falar à minha volta, e tu sempre entravas pela minha cabeça de um jeito mas teimavas em sair pela minha boca de outro, muito deformado e balbuciante, e bastante diferente de como te ouço hoje quando abro a boca para te ouvia soar. Preciso dizer-te que foste afinal ganhando forma à medida que eu crescia e ganhava corpo, e te revelaste crucial para que eu não explodisse, com tantos sentimentos e angústias a precisar de uma forma, a forma que tu acabaste por lhes dar, e sempre à tua maneira. Preciso dizer que mais tarde, quando eu já te escrevia, acreditando, na minha inocência, que te possuía enfim e poderia fazer de ti o que bem quisesse, eu fiz de ti, sim, o que bem quis, mas no fundo o que fiz não foi nada mais do que fazer de ti fonte de expressão do que eu fui, era e teria sido, e tu és bem mais do que isso. Preciso dizer-te que, passados os anos, ainda hoje me sirvo de ti, quando me vejo às voltas com tudo aquilo que te escrevo apenas para saber, como alguém escreveu, o que escreveria caso escrevesse. Preciso dizer-te, por fim, que, um dia, quando já não mais me apareceres sob algumas das tuas formas; quando já não mais te puder captar como som que és, eu te terei por perto como tinta que também és; e, quando já não mais te puder vislumbrar como tinta que és, eu te terei como gesto que sempre poderás ser. E, mesmo quando já não mais te puder usar de nenhuma destas formas, quando então terei de me contentar e distrair com o que guardei de ti aqui dentro e ao longo do tempo, mesmo assim estarás aqui comigo e serás necessária para que eu me possa manter de pé e me enxergar a mim mesmo e dar sentido ao mundo. E, sempre que eu cair no erro de achar que fiz de ti o que queria fazer e que te escrevi como queria escrever, poderei enfim dizer-te que já não preciso de ti? Não poderei. Pois preciso. E precisarei de ti até ao preciso instante em que todas as palavras que tenho aqui dentro se acabarem, quando já não precisarei de ti – nem de nada.

 

Juva Battela, Jornal de Letras

publicado por carlos lopes às 14:16

03 de Maio de 2010

 

Há coisas que nos surpreendem.

Um letreiro...por exemplo.

 

 

 

publicado por carlos lopes às 19:16

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